15 de março.
Dia da Escola.
Data escolhida para o início da I Mostra da Escola de Governo Fiocruz – Brasília.
A EGF-Brasília completou dez anos de atuação no DF, em 2022. Se inicialmente foi estruturada para formar gestores, ao longo de sua primeira década ampliou o escopo de atuação para trazer a essência da Fiocruz não só como instituição de Estado, mas também como espaço de vivência de pluralidade, que reflete sobre políticas públicas de saúde.
A aula inaugural do ano letivo, que marcou a primeira atividade da programação da Mostra, teve como tema “Construção coletiva de cidadania e utopia para o fortalecimento do SUS, para além dos tempos de crise”. O educador popular e professor da Universidade Estadual de Goiás (UEG), Carlos Rodrigues Brandão, compartilhou com os participantes online parte de suas leituras e inquietações atuais para o ensino após esse período de convivência com a Covid-19 e suas consequências. Ele também é professor emérito da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e da Universidade Federal de Uberlândia (UFU). Comentando sobre o livro Paideia, de Werner Jaeger, ressaltou o capítulo A medicina como Paideia. A obra é sobre educação, mas dedica uma parte à medicina como pedagogia, pois o médico é o primeiro profissional da pergunta, aquele que, antes de dizer o que sabe, tem que perguntar. Antes de prescrever o que o usuário precisa, deve fazer a anamnese, isto é, perguntar ao outro o que ele sente e, a partir da verdade que esse outro diz, propor um tratamento. Seria um diálogo em que, mesmo com muito conhecimento médico, a interação entre o que o doente diz e o que o profissional acredita que sabe é que resulta em um tratamento.
O pesquisador Carlos Gadelha, coordenador do Centro de Estudos Estratégicos (CEE) da Fiocruz, comentou a aula de abertura chamando a atenção dos alunos para que aprendam sempre. Ele falou sobre a crise estrutural que vem desde antes da pandemia, exemplificada pelo avanço de uma ciência e tecnologia desconectadas das realidades sociais e que ampliam as desigualdades. Segundo ele, a mãe de todas as desigualdades é a desigualdade do conhecimento, tema que já foi debatido por ele e demais autores em artigo em coautoria com a presidente da Fiocruz, Nisia Trindade, que abriu o evento.
A diversidade das pessoas não pode quebrar a equidade do acesso. Na Fiocruz, ou é para todos, ou não é para ninguém. O SUS, segundo Gadelha, pode iniciar um movimento que articula Democracia, Estado e entrada na Revolução 4.0, em parceria com outros setores, já que não se teria vacinas para Covid-19 sem articulação com o setor privado, por exemplo. Ele ressaltou também que é necessário inverter as políticas públicas, onde o bem-estar, o ambiente e a democracia não caibam apenas no Produto Interno Bruto (PIB), mas sejam solução para que a renda per capita volte a crescer. “A sociedade muda e essa transformação gera crescimento. Um caminho para se pensar política pública deve ser baseado nos critérios social e ambiental”, disse.
Mesa de abertura
De hoje (15/3) até sábado (19/3), a I Mostra reúne toda a comunidade da EGF-Brasília (egressos, estudantes, docentes, tutores, preceptores, pessoal técnico-administrativos, redes parceiras, como UnB, Governo do DF, Ministério da Saúde, movimentos sociais, entre outros) em uma série de atividades online ou em formato híbrido, com o tema “Escola em transformação: nossa escola e o inédito viável”. Antes da aula inaugural, uma mesa com diferentes autoridades demonstrou a intersetorialidade da instituição e suas parcerias estratégicas para o SUS.
A presidente da Fiocruz, Nísia Trindade Lima, ressaltou que a Escola reflete o caminho da educação como caminho de pesquisa, diálogo com a sociedade e construção de uma agenda que dê sentido a esse mote que inspira o trabalho, a pedagogia da esperança, de Paulo Freire. “Esperança como fruto de consciência coletiva, de experiência histórica”, afirmou.
A diretora da Fiocruz Brasília, Fabiana Damásio, ressaltou que a Mostra tem um sentido especial de reconhecimento da diversidade de ofertas educacionais da Escola, que vão de aproximações com a educação básica ao mestrado. Ela destacou a presença da Universidade Aberta do SUS (UNA-SUS) e sua contribuição para a formação em saúde no país. “O exercício de organizar a Mostra desvelou nossos feitos, nossas construções e nosso caminhar, embasado no fortalecimento de nossas raízes teóricas e metodológicas e nos nossos valores”, ressaltou.
O respeito à diversidade, a equidade e a justiça social, fazendo da educação um processo emancipatório e trazendo a ciência cidadã como prática presente, são marcas da EGF-Brasília. Fabiana lembrou que, no mais recente Congresso Interno da Fiocruz, realizado em dezembro do ano passado, foi aprovada uma tese que reforça o diálogo da Fiocruz com a sociedade, reafirmando o compromisso da instituição com a democracia, a participação e a promoção da equidade. A Escola, para além de espaço de formação técnica, é também berço de reflexão crítica e política, de resistência às adversidades, reafirmando os princípios e diretrizes do SUS, que na pandemia deu respostas às necessidades dos brasileiros.
A diretora da EGF-Brasília, Luciana Sepúlveda, ressaltou que não há um único horizonte possível. Segundo ela, a educação é um processo humano, e a Escola é um dos vários lugares de educação, vida e cultura. “Precisamos nos transformar para viver e solucionar os problemas que se apresentam para nós. Nossa educação não é transmissão de informações; ela constrói profissionais reflexivos e capazes de lidar com as incertezas e adversidades”, destacou. A discente Laurianna Alexandrina Neves, da Residência Multiprofissional em Saúde da Família com ênfase em Saúde da População do Campo, também destacou que a comunidade Escola é construída junto com os estudantes.
A presidente do Conselho Distrital de Saúde, Jeovaria Rodrigues Silva, ressaltou que, recentemente, foram formados pela EGF-Brasília mais de 60 educadores populares e mais de 100 agentes populares de saúde, conformando uma rede que se faz com a participação social para fortalecer a característica democrática e participativa do SUS. “Os inéditos viáveis já estão acontecendo todos os dias”, lembrou. Concorda com ela a diretora da Escola Superior de Ciências da Saúde do DF, Marta David Rocha. Para ela, comemorar os dez anos da EGF-Brasília é celebrar a educação em saúde e as mais variadas formas de conhecimento e cooperação voltadas para uma visão ética e bioética na gestão e no planejamento em saúde, além da comunicação e da análise de dados com compromisso de promoção da saúde no DF. Ela citou ainda a frase de Paulo Freire, cujo centenário foi celebrado ano passado: “Ensinar não é transferir conhecimento, mas criar possibilidades para sua própria produção e construção”.
De acordo com a decana de Extensão da Universidade de Brasília (UnB), Olgamira Amancia Ferreira, a parceria da Fiocruz com a UnB não se reduz a um prédio, mas tem uma identidade com o que se busca na Universidade – a produção de ciência e tecnologia vinculadas às necessidades das pessoas. Ela lembrou também a iniciativa Mais Meninas na Ciência, em parceria com a Fiocruz Brasília.
Já a coordenadora do Lato Sensu e do Fórum da Escola de Governo da Fiocruz, Isabela Fernandes Delgado, lembrou que a Fundação se credenciou como Escola de Governo em 2017, e que a necessidade regulatória à época se transformou em um espaço rico de compartilhamento, com o Fórum, em que todas as unidades da Fiocruz com ofertas no lato sensu se encontram. Pautas da educação têm sido presentes no Conselho Deliberativo da Fiocruz, instância máxima de tomada de decisões da instituição.
Da Coordenação-Geral de Emergências em Saúde Pública do Ministério da Saúde, Janaina Sallas afirmou que a parceria com a EGF-Brasília vem se fortalecendo com a elaboração de pesquisas. Mais recentemente, ações de formação para fortalecimento da vigilância em saúde, com a educação permanente de profissionais nos estados e municípios, mereceram destaque, em especial o programa EpiSUS, com mais de 700 epidemiologistas de campo formados.
O diretor de Políticas Públicas e Articulação Institucional da Secretaria Nacional de Políticas sobre Drogas, Gustavo Camilo Baptista, observou que a diversidade da mesa de abertura da Mostra, com caráter interinstitucional, é um retrato da diversidade de ofertas da EGF-Brasília. Ele lembrou a formação que a Fiocruz Brasília na área de Saúde e Segurança na Escola, em 2019, que envolveu 1800 professores em formato de educação à distância e com educação entre pares, com resultados muito interessantes e que se desdobram até hoje. “Parceiros para fazer capacitações existem em grande quantidade no governo federal, mas a Escola permite também vincular esse processo a uma discussão de politicas públicas de maneira intersetorial e interfederativa, com participação popular”, ressaltou.
A coordenadora da Mostra, Tatiana Novais, representou o corpo docente da instituição na mesa de abertura. Para ela, assim como a Semana de Arte Moderna, cujo centenário se celebra este ano, significou o rompimento e a mudança de um paradigma, a Mostra apresenta a Fiocruz Brasília em um novo tempo. “A Mostra é nossa, da comum–unidade, comunidade Fiocruz Brasília!”.