A Escola de Governo Fiocruz – Brasília (EGF-Brasília) completou dez anos em 2021. Nesse tempo, muitos profissionais passaram pelas salas de aula (online e físicas) da unidade da Fiocruz na capital federal. Durante a I Mostra da EGF-Brasília, professores e egressos contaram sobre suas experiências, metodologias utilizadas, aprendizados e vivências ao longo desses anos. “A EGF-Brasília surgiu com a missão de formar profissionais e construir soluções inovadoras para o fortalecimento do SUS”, lembrou o mediador da mesa Diálogos Pedagógicos: Nossa História e o Inédito Viável realizada na última quarta-feira (16/03), o jornalista André Freire.
A diretora da Escola, Luciana Sepúlveda, apresentou o Fórum Ciência e Sociedade (FCS), tecnologia de educação não formal de popularização da ciência que surgiu em 2002. Voltado para estudantes e professores dos últimos anos do ensino fundamental e do ensino médio de escolas públicas, o Fórum tem o objetivo de aproximar, de forma dialógica, a pesquisa de ponta da sala de aula. Nesses 20 anos, já foram trabalhados diversos temas ligados ao meio ambiente e de destaque na mídia, muitas vezes não previstos no currículo escolar, mas presentes na vida da comunidade escolar.
Sepúlveda explicou que o Fórum busca apresentar a perspectiva da ciência como um direito de cidadania, de como ela funciona e sua implicação no cotidiano, dialogando com o saber do estudante. “A ciência está relacionada à nossa capacidade de questionamento do mundo. Percebemos que os jovens entenderam que não precisa ser um PhD ou especialista para discutir um tema de ciência. É possível embasar o argumento, encontrar uma fonte fidedigna e, principalmente, exercitar a argumentação respeitosa com base nas ideias”, destacou a coordenadora do Fórum.
“Os estudantes debatem com pesquisadores. Para os jovens, nessa idade, vislumbrarem a possibilidade de serem cientistas ou o que eles quiserem ser, verem que o mundo é possível para eles é muito importante. Transformação é a palavra que define quem passou pelo Fórum Ciência e Sociedade”, definiu a pesquisadora Regina Padrão, integrante da equipe de coordenação do FCS.
O egresso do projeto Abder Paz concorda com a afirmação. Ele participou de uma das primeiras edições, quando, à época, cursava o ensino médio, e afirma que o Fórum foi importante para ajudá-lo a definir o que faria como cidadão e a valorizar a cultura do fazer, das comunidades e da tradição. “Mudar o mundo através da própria janela, o Fórum me deu essa oportunidade e teve um papel importante na minha vida pessoal e profissional. Debatemos de igual para igual com pessoas que têm uma bagagem de conhecimento muito grande”, lembrou.
Com entusiasmo, a professora do Centro de Ensino Fundamental 34 de Ceilândia Mariana Siqueira define que é uma profissional diferente desde que participou do Fórum com seus alunos. “Pensava em possibilidades metodológicas de mudar aquele ambiente e, de repente, me deparei com esse mundo da ciência, isso me transformou completamente como profissional. Me abriu os olhos de que a sala de aula é um grande laboratório, em que podemos fazer mudanças a partir de intervenções culturais e sociais naquele território onde a gente trabalha, combatendo para minimizar todas as iniquidades que encontramos. Para os estudantes também é muito rico, não só os que participam, mas os de toda a escola”, afirmou, lembrando da importância do investimento na educação e na ligação do ensino da base ao superior.
Outra experiência apresentada foi o Ciclo de Debates do Núcleo de Estudos sobre Bioética e Diplomacia em Saúde (Cideb), que surgiu com o objetivo de aproximar as relações internacionais, a saúde pública e a bioética dos grupos sociais e entidades. A iniciativa é realizada periodicamente pelo Núcleo de Estudos sobre Bioética e Diplomacia em Saúde (Nethis) da Fiocruz Brasília e promove discussões sobre temas da saúde sob a perspectiva das relações internacionais. O coordenador do Nethis, José Paranaguá, define o Ciclo como eixo motor, que promove participação social, reflexão, debate e desenvolvimento de estudos científicos interdisciplinares.
Larissa Otaviano começou no Nethis no estágio obrigatório do curso de Saúde Coletiva e hoje é residente multiprofissional em Gestão de Políticas Públicas da Fiocruz Brasília. O seu trabalho com doenças crônicas e não transmissíveis teve início pelo Cideb. “Em temas como agrotóxicos, tabaco, alimentos ultraprocessados e álcool, muitas vezes, não temos a perspectiva das relações internacionais, é muito enriquecedor quando passamos a ver de outra forma. Depois que eu descobri algumas temáticas, hoje é impossível pensar em políticas públicas no Brasil e em doenças crônicas sem pensar nesses assuntos”, disse.
Comunicação como direito
A comunicação é constitutiva da saúde, mas também essencial a ela. A afirmação foi feita pelo coordenador da Especialização em Comunicação em Saúde: fundamentos, práticas, agendas e desafios e da Assessoria de Comunicação da Fiocruz Brasília, Wagner Vasconcelos, ao explicar como o curso foi idealizado. “Todos nós temos direito à comunicação, mas, em especial, porque a comunicação está aliada à construção de sentidos que leva as pessoas a tomarem decisões em relação à sua própria saúde. Por isso que a gente sempre considerou esse curso essencial, para além da demanda que recebíamos de instituições parceiras”, explicou.
A experiência nas áreas pesquisa e ensino – como as quatro atualizações já ofertadas – auxiliou na construção do primeiro curso de especialização genuinamente da Assessoria de Comunicação, com parcerias locais. As aulas aliam teoria e prática e buscam atender diferentes perfis de profissionais, desde os que atuam no mercado da comunicação, jornalistas da grande imprensa e que colaboram com a formação de sentido da saúde, até trabalhadores da saúde.
O jornalista Ubirajara Rodrigues é aluno da primeira turma, que está em fase de finalização. Para ele, a grande importância do curso foi levar para a prática o conhecimento mais aprofundado, entender a comunicação como parte estruturante da saúde e atuar de forma diferente, não só com demandas cotidianas, mas melhorando instrumentos utilizados e diálogos entre as pessoas dentro da instituição. “Fazer esse movimento pensando que quem trabalha no serviço público trabalha para a ponta, para o Brasil ter melhores condições de acesso à informação de qualidade, pela busca por instrumentos dialógicos de parceria e espaços de discussões, pode ser um diferencial em prol de uma comunicação melhor, de uma linguagem que possa ser entendida pela população. Temos um papel transformador dentro da instituição”, ressaltou.
Transformação para novos olhares
O processo para a inserção dos Programas de Residência, do Mestrado Profissional em Políticas Públicas em Saúde e da Especialização em Saúde Coletiva no rol de capacitações da Escola de Governo Fiocruz- Brasília também foi apresentado pelos pesquisadores e professores Armando Raggio, Flávia Elias, Socorro Souza, Jorge Barreto e Érica Tatiana.
Os egressos contaram suas histórias com a instituição e algumas experiências vivenciadas. “A Fiocruz mudou totalmente as nossas vidas, foi um espaço que me permitiu ingressar na vida profissional”, afirmou a egressa da Residência Multiprofissional em Gestão de Políticas Públicas Juliane Alves. “Saí da caixa e passei a enxergar a gestão de outra forma, para além de protocolos, documentos e leis, mas como um lidar diário com seres humanos”, afirmou a também egressa Ana Vitória Ribeiro.
Samyra Akasha, egressa da Especialização em Saúde Coletiva, definiu o curso como um espaço para a inovação com olhares diversos, da ciência feita não só pela academia, mas também como lugar de construção social e reflexão sobre gênero, raça, povos tradicionais e originários, como essas populações também podem participar da ciência e como os cientistas podem se abrir a esse diálogo. Para a egressa Luiza Rosa, a Especialização foi um processo de mudança de paradigmas – a Fiocruz a fez ampliar o horizonte para processos formativos diferentes do tradicional e enxergar a realidade sob uma nova ótica.
Para o professor e pesquisador Jorge Barreto, ex-coordenador do Mestrado Profissional em Políticas Públicas em Saúde, os depoimentos dos alunos resumem o que a Escola de Governo Fiocruz-Brasília representa em todos esses anos de implementação das atividades. “A Escola tem efetivamente um lugar especial no território, não só considerando o Distrito Federal, porque expandimos a atuação para outros estados. É possível ter uma Escola de Governo só para formar técnicos, ou uma Escola rica e diversa como a da Fiocruz Brasília, que compreende as relações entre Estado, governo, sociedade e mercado de uma forma mais complexa”, destacou.
O painel foi transmitido ao vivo pelo YouTube. Para acessar a gravação e saber mais sobre as experiências apresentadas, clique aqui.
A programação da I Mostra EGF-Brasília continua até sábado (19/03), com o debate de diferentes temas e apresentações de vivências. Confira a programação em www.even3.com.br/mostraescolafiocruzbsb