O que aconteceu?
Quem?
Quando?
O que sentimos?
Quais foram as mudanças?
Por que aconteceu assim?
E agora?
Essas perguntas conduzem uma boa sistematização de experiências para que se construam aprendizagens significativas, segundo o sociólogo e educador popular peruano Oscar Jara Holliday, que fez a palestra de encerramento da I Mostra da Escola de Governo Fiocruz – Brasília, na tarde do último sábado, 19 de março.
Ele explicou que a sistematização de experiências pode ter muitos sentidos, desde a reconstrução narrativa, a documentação de um processo para padronizar um protocolo, a produção de relatórios de atividades, ou mesmo a escrita e publicação de artigos para divulgar alguma prática. Toda experiência é composta de ações e reações, histórias pessoais e coletivas, situações particulares e também dependem do contexto em que estão inseridas. Cada pessoa envolvida na experiência participa com suas ideias, conceitos, interpretações e preconceitos, sensações, emoções, intuições, sonhos, medos, vontades e disposições que marcam o sentido do que se faz, bem como as relações entre as pessoas e organizações. A interação entre todos esses elementos articulados não deve ser ignorada em uma sistematização de experiências.
Segundo ele, as experiências de saúde trazem potencialidades e é necessário esforço para explicitar, construir e descobrir essa aprendizagem. Importante também é reconstruir o processo vivido para analisá-lo e interpretá-lo criticamente, e assim atrair as aprendizagens significativas para, em seguida, compartilhar esse conhecimento. Só de ter que preparar a sua fala para explicar uma experiência, já se está fazendo análise dela, e as reações das pessoas ao redor podem contribuir com experiência semelhante. Esse diálogo vai aprimorando a nossa experiência. Essa é a proposta da educação popular para a sistematização de experiências.
E para que sistematizar experiências?
Para compreender mais profundamente as experiências e assim melhorá-las, compartilhar os aprendizados (e não só narrações) com outras experiências semelhantes, contribuir para a reflexão teórica com conhecimentos surgidos diretamente das experiências, e incidir em políticas a partir de aprendizados concretos delas. “A sistematização de experiências produz e partilha conhecimentos e aprendizagens significativas que permitem nos apropriar criticamente das experiências vividas, compreendê-las teoricamente e orientá-las ao futuro com uma perspectiva transformadora”, ressaltou.
Holliday explicou que sua proposta metodológica de sistematização de experiências tem como ponto de partida a própria experiência vivida. Dela se faz um plano de sistematização, que prevê a recuperação histórica do processo vivido, seguido de análise e interpretação crítica, até chegar a conclusões e recomendações. Da sistematização de experiências se espera a apresentação de produtos comunicativos e linhas de ação para o futuro. O educador popular alertou que não basta a memória, é necessário registro, seja por meio de diário de campo, fotos, vídeos, mapas, recortes de jornal, atas de reunião, memoriais, relatórios e até comunicações em redes sociais.
Ao longo da I Mostra, vários palestrantes reafirmaram que a pandemia deu visibilidade e agravou as crises pré-existentes. No encerramento, o professor Oscar Jara citou o texto Pedagogia do Oprimido, de Paulo Freire, que pondera que em situações-limite é necessário criar os inéditos viáveis. “Fazer as mudanças possíveis hoje, pois elas criam condições para outras mudanças que hoje não são possíveis. O desafio não é estar à porta de um novo período histórico, mas construir novas possibilidades no cotidiano. As respostas que damos no contexto da pandemia podem abrir possibilidades inéditas”, disse ele, lembrando que há um confronto ético que se expressa na política e na pedagogia. Para o sociólogo, há dois paradigmas em disputa: de um lado, o mercado, lucro, autoritarismo, discriminação, depredação, ódio e exclusão. Do outro, o cuidado da vida, equidade, democracia, respeito, solidariedade e amorosidade. Portanto, a ciência e a consciência devem permear os processos investigativos e formativos, político-pedagógicos e isso baseia os métodos, técnicas e procedimentos.
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