Nathállia Gameiro
Pesquisadores da Fiocruz participaram dos quatro dias de evento com palestras, rodas de conversa, comentários de trabalhos e na assinatura de termo de cooperação
Brasília recebeu, entre os dias 2 e 5 de julho, o 35º Congresso Nacional das Secretarias Municipais de Saúde, que reuniu mais de cinco mil gestores, profissionais de saúde e trabalhadores do SUS. A extensa programação contou com oficinas, seminários e debates sobre temas como financiamento da saúde, educação permanente, orçamento público e judicialização.
A Fiocruz participou de todas as edições do Congresso com estandes e exposição de projetos e produtos, mas este ano teve participação mais intensa em palestras, como comentaristas em apresentações de experiências da Mostra Aqui tem SUS, com a organização da Roda Prática IdeiaSUS e a assinatura do protocolo de cooperação com o Conselho Nacional de Secretários de Saúde (Conass) e Conselho Nacional de Secretarias Municipais de Saúde (Conasems). Clique aqui para saber mais.
Mais de 500 experiências de diversos estados, cidades e municípios brasileiros foram apresentadas na Mostra Aqui tem SUS, durante os quatro dias do evento. “O Congresso possibilita a troca. Estamos avançando em um modelo de avaliação das experiências e de disseminação dessas práticas, que são verdadeiras tecnologias de promoção, vigilância, assistência e planejamento. É uma grande demonstração de que a criatividade é fundamental para a implementação de políticas de saúde”, destacou o chefe de gabinete da Presidência, Valcler Rangel.
Para ele, a cada ano o Conasems dá mais importância para as experiências municipais, mostrando o que o SUS faz de bom. Ele avalia que agora é preciso ir além do Congresso, fazer com que haja troca de informações entre as secretarias municipais, os participantes do congresso e as universidades que não têm tanto contato com a realidade local, além de mostrar as experiências para a população. “As palestras trouxeram uma visão de como o Ministério da Saúde, o Conass e o Conasems estão vendo este momento crítico do SUS. As pessoas saíram animadas com as experiências, preocupadas com o momento crítico e mobilizadas para fazer algo em seu municípios e estados para enfrentar a situação que a gente vive”, afirmou. Rangel destacou ainda a fala do ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta, durante a abertura do evento, em que citou a Fiocruz de maneira afável e colocou a instituição no campo de enfrentamento de grandes questões nacionais.
Durante palestra realizada no dia 4 de julho, Valcler apresentou o projeto de cooperação entre as três instituições, Fiocruz, Conasems e Conass, que busca encarar o SUS como um ambiente de saúde e inovação, com expansão da atenção básica para possibilitar um campo de inovação diversificado e direcionado à solução de problemas centrais da implementação SUS nas esferas locais, regionais e nacional.
O acordo entre as instituições teve início em 2010, com foco na priorização da agenda estratégica interinstitucional para o setor, gestão dos sistemas de saúde baseado em evidências científicas e ampliação e aperfeiçoamento de práticas e soluções de saúde e ambiente. A parceria resultou, em todos estes anos, em estudos de levantamento de prioridades políticas, análise da situação do planejamento em saúde nos estados, levantamento de problemas e análise do financiamento e do gasto no setor, além de eventos e a plataforma Banco de Práticas IdeiaSUS.
O protocolo de cooperação assinado durante o Congresso integra essas ações. Está em processo de elaboração de plano de trabalho e resultará em aditivos específicos para as áreas de ensino e formação, pesquisa e inovação, desenvolvimento tecnológico, disseminação de informação e para cooperação técnica e apoio institucional. Rangel apresentou propostas de ações em cada eixo prioritário da cooperação.
Ideia SUS
As instituições notaram a existência de experiências nacionais e internacionais, principalmente no desenvolvimento de tecnologias sociais, e o baixo aproveitamento pela gestão e academia. Assim surgiu o Ideia SUS, Banco de Práticas e Soluções em Saúde e Ambiente, que identifica, mapeia, registra, sistematiza, divulga e dissemina práticas e soluções para o SUS, implantadas nos diversos territórios do país. Podem ser cadastradas soluções exitosas ou não, pois na plataforma é considerada a consistência do projeto que está sendo executado.
Durante o Congresso do Conasems, foi realizada a 8ª Roda de Práticas e Soluções em Saúde, com a apresentação das cinco práticas premiadas em 2018 em cada região do país. Os participantes relataram que o olhar dos profissionais de saúde para o usuário mudou. Citaram o Instituto Nacional de Assistência Médica da Previdência Social (Inamps), criado em 1977, em que somente os contribuintes da Previdência Social eram atendidos, os outros brasileiros eram considerados indigentes. O atendimento universal só foi possível com a criação do SUS. Para Solange Cirico, do Cosems RJ, com o passar dos anos, o atendimento no SUS tem se tornado mais humanizado.
É o que mostra a experiência apresentada pelo representante da Secretaria Municipal de Saúde de Porto Seguro (BA), Kerris Ruas, do projeto da região nordeste premiado no último ano, que presta assistência aos moradoras de rua. O objetivo é ampliar o acesso e a qualidade de vida. Ele relatou que essas pessoas perdiam atendimentos no serviço público de saúde por não terem documentos de identidade. “Eles não se viam como parte integrante da sociedade”, contou.
Como parte do projeto, os profissionais realizaram capacitação para registro, cadastro e atendimento dos novos usuários. Foram realizadas ações nas ruas com testes rápidos para detecção de doenças como hanseníase, HIV e tuberculose, encaminhamento para abrigos, diagnósticos, tratamentos e rodas de conversa para conscientização e continuidade dos tratamentos. “O primeiro passo foi entender a população e depois dar início ao atendimento. Hoje eles que nos procuram para consultas”, afirmou.
Ações de educação permanente de trabalhadores da saúde, academia viva, oficinas terapêuticas para cuidado de saúde mental e cuidados com o lar foram outras iniciativas vencedoras do prêmio 2018. Confira aqui. “É muito bom saber que o SUS vive em cada lugar desse Brasil. Essa roda de conversa mostra a força de quem não se amedronta a cada desafio e incentiva outras pessoas a produzir. Nossa energia e vontade fazem a diferença, a vida do SUS está dentro de nós”, afirmou o pesquisador e comentarista especializado em Saúde Pública André Bonifácio. O coordenador do Núcleo de Saúde Mental da Fiocruz Brasília, André Guerrero, também comentarista da Roda, lembrou da importância de firmar parcerias para a execução de projetos e atendimento à população, construindo soluções.
Acompanhamento
O Ideia SUS acompanhará essas iniciativas com curadoria, registros em diferentes formatos, visitas e avaliação dos resultados. Confira os documentários com as experiências exitosas das secretarias municipais de saúde de todas as regiões do país, premiados na Mostra Brasil, Aqui tem SUS. Assista aqui a primeira, a segunda e a terceira temporada.
O SUS na mídia
O chefe de gabinete da Presidência da Fiocruz, Valcler Rangel analisou a imagem do SUS na mídia como parcial, em que se destacam as emergências de hospitais, atendimento que os usuários têm mais contato, e que ele classificou como precárias para a demanda que o país tem. “Principalmente porque o Brasil tem um perfil epidemiológico de muitos acidentes, violência, maus cuidados com hipertensão que geram infarto, doenças agudas. Na verdade o SUS precisa, na atenção primária, cuidar da condição crônica e cuidar ainda das doenças infecciosas, da vacinação e prevenção dessas doenças, fazer ação comunitária, como no caso das arboviroses. A imagem do SUS [na mídia] exalta os gargalos que existem; não inventa problemas, eles são superexpostos”, explicou.
Rangel lembrou ainda de pesquisas que mostram que as pessoas atendidas pelo SUS avaliam o sistema melhor do que quem está de fora. A divulgação de experiências exitosas do SUS por profissionais de saúde e jornalistas foi destacada por ele. “Precisamos falar mais de jornalismo de soluções, que se faz muito no exterior e pouco no Brasil. Nós profissionais de saúde temos um linguajar muito técnico, fora do nosso circuito ninguém entende o que são as siglas ou termos. Precisamos traduzir isso melhor”, afirmou. Para Rangel, a combinação entre mídia e profissionais de saúde é essencial para comunicar de forma evidente o SUS que dá certo, além de fazer prospecção das boas experiências e o aprofundamento do tema.