No Brasil, persistem 25 mil leitos psiquiátricos do SUS, apesar do preconizado pela Reforma Psiquiátrica de reinserção do doente na sociedade e de tratamentos em unidades ambulatoriais. Este dado foi apresentado ontem (19), pelo médico psiquiatra Paulo Amarante, coordenador do Laboratório de Estudos e Pesquisas em Saúde Mental e Atenção Psicossocial (Laps/Ensp/Fiocruz), durante a 8ª Jornada Educação Cultura e Saúde.
O médico critica a redução da reforma psiquiátrica a uma simples reforma de serviços e defende uma reforma da cultura. Para ele, este é um processo social complexo de ampliação de direitos de pessoas que foram excluídas e envolve diferentes setores, não apenas a saúde. “Não é porque a pessoa tem um transtorno que não é cidadão, isso é um atraso da medicina. O risco, a periculosidade dos chamados doentes mentais, é muito menor do que de pessoas saudáveis que estão soltas cometendo atos de violência social e sexual”, exemplifica.
Para a desativação dos 25 mil leitos manicomiais, Paulo pondera que é necessária uma definição de estratégia. O pesquisador ressalta que mesmo depois de anos nenhum governo, pensou em realocar essas pessoas e dar um tratamento mais humano, com lazer, inclusão social e moradias. E até hoje não existe um planejamento para a desmontagem da estrutura manicomial e simultaneamente a construção de estruturas substitutivas.
“A reforma psiquiátrica exige mudança de visão e atitude para um processo permanente de transformação de técnicos de saúde, usuários, familiares e da sociedade como um todo. Devemos transformar essa relação na prática, ao invés de construir manicômios, locais de repressão e controle. É preciso superar o modelo existente e inserir os pacientes em um local de produção de sociabilidade”, afirmou.
Durante o evento, Paulo Amarante lançou o livro Teoria e Crítica em Saúde Mental. A obra, voltada para profissionais da saúde, tem como objetivo trazer uma visão mais ampla do campo psicossocial. Esta coletânea traduz a trajetória política e conceitual do escritor em sua vida profissional, servindo como referência para muitas pessoas que atuam na área da saúde mental- usuários dos serviços, familiares, técnicos, professores, pesquisadores e ativistas de defesa dos direitos humanos e da cidadania. As reflexões do autor visam contribuir para o permanente avanço da reforma psiquiátrica no Brasil.
A 8ª Jornada Educação Cultura e Saúde, promovida pelo Programa de Educação Cultura e Saúde da Fiocruz Brasília reuniu estudantes, profissionais da saúde e pacientes. A programação contou também com mostra de artes da saúde mental, coral do Instituto de Saúde Mental (ISM) e exposição caco terapêutico – oficina em saúde mental que iniciou com a busca da matéria-prima no lixão, restos de azulejos e MDF.