“O Conselho Deliberativo da Fundação Oswaldo Cruz, em reunião extraordinária realizada em 19/5/2016, aprovou por unanimidade uma Carta Aberta em defesa do Sistema Único de Saúde (SUS).
A Fundação Oswaldo Cruz foi, desde o processo de redemocratização do país, protagonista na luta pela construção do Sistema Único de Saúde. Pautada pelo princípio de que a saúde é uma necessidade humana e, portanto, um direito inalienável, lutou pela construção de um sistema universal, onde todos os brasileiros pudessem ter o direito à saúde garantido pelo Estado.
O SUS, embora represente hoje um projeto civilizatório inconcluso de ampliação da cidadania e dos direitos sociais, tem promovido avanços incontestes na saúde pública brasileira, como pode ser observado nos mundialmente reconhecidos Programa Nacional de Imunização (PNI) e de atenção ao HIV/Aids e nas políticas de transplante, de assistência farmacêutica e de atenção primária, com o Programa Saúde da Família, que com outras tantas políticas, tem promovido resultados importantes, como a redução da mortalidade infantil e o aumento da expectativa de vida no país.
Em função disso, causam profunda preocupação as declarações do ministro da Saúde, Ricardo Barros, veiculadas pela imprensa nos últimos dias, que indicam a existência de um projeto em curso de revisão dos preceitos constitucionais que garantem o direito universal à saúde. A ideia de que o país não tem condições para arcar com o tamanho do SUS revelam, na prática, um projeto de país e de nação onde os direitos sociais não têm prioridade e estão subordinados aos interesses econômicos.
Tal ideário, expresso em iniciativas anunciadas por forças políticas presentes tanto no poder Executivo quanto Legislativo – como a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 143/2015, que amplia a desvinculação do orçamento da União, estados e municípios, e da PEC 451, que prevê a obrigatoriedade de contratação de planos de saúde pelas empresas, com forte impacto setorial – tem o propósito de promover o desmonte da saúde pública brasileira, agravando o subfinanciamento crônico do SUS.
Somam-se a isso as medidas econômicas regressivas que se anunciam, como a fixação de teto para o crescimento dos gastos públicos, reforma da Previdência e revisão regressiva do sistema tributário. Todos estes movimentos representam uma afronta à Constituição Cidadã de 1988 e às deliberações de todas as Conferências Nacionais de Saúde e aos reiterados posicionamentos do Conselho Nacional de Saúde.
Não haverá um Brasil desenvolvido sem um sistema de proteção social que garanta a todos a saúde como um direito. Por isso, o Brasil precisa ampliar a destinação de recursos para a saúde. Precisa promover avanços que assegurem o caráter público da gestão dos serviços; as políticas de fortalecimento da ciência, tecnologia e inovação voltados para a sustentabilidade do SUS; mais investimentos nos profissionais de saúde e a valorização dos servidores públicos, sendo fundamental, entre outras medidas, a aprovação dos Projetos de Lei 4.250 ao 4.255/2015, que dispõem sobre o aprimoramento e a reestruturação de carreiras do serviço público, e a aprovação do PL 4252/2015, que garante os acordos firmados com os servidores federais.
O SUS precisa ser ampliado e consolidado. Na mesma direção, é fundamental que a seguridade social, entendida como a integralidade dos campos da assistência, saúde e previdência, seja respeitada e conformada como um direito, e não seja subordinada a uma lógica de mercado, na perspectiva de redução de direitos e reforma econômica da Previdência visando o equilíbrio de contas, que certamente podem trazer impacto deletérios na vida da população.
Da mesma forma, como instituição que se situa na interseção entre as áreas de saúde e ciência, tecnologia e inovação, a Fiocruz reforça os termos de seu manifesto contrário à incorporação do Ministério de Ciência, Tecnologia e Inovação ao Ministério das Comunicações, que revela visão estreita quanto ao papel da saúde e da CT&I para o desenvolvimento sustentável, voltado para a paz e o bem-estar da sociedade.
Por isso, o Conselho Deliberativo da Fiocruz conclama todos a uma reflexão sobre o atual momento e sobre as ameaças reais aos direitos arduamente conquistados, como forma de reafirmar os preceitos da Constituição de 1988 e fortalecer um amplo movimento em defesa do SUS e da ciência, tecnologia e inovação no Brasil.”