Com o tato, olfato e audição. É assim que algumas pessoas enxergam o mundo à sua volta. Na última quarta-feira, 21 de setembro, data em alusão ao Dia Nacional de Luta da Pessoa com Deficiência, a Fiocruz Brasília realizou roda de conversa para debater a inclusão e acessibilidade das pessoas com deficiência.
O evento teve início com um café sensorial, em que os participantes tiveram o desafio de descobrir, com os olhos vendados, o que foi servido por meio do toque, da textura e cheiro das frutas e pães dispostos em uma mesa. O desafio se tornou ainda maior na hora de servir no copo o suco que estava na jarra. Dificuldade enfrentada também por quem precisa utilizar muletas ou cadeira de rodas.
Além da venda nos olhos, outros participantes tiveram os movimentos limitados, se locomovendo pelos jardins da instituição, podendo sentir um pouco do que muitos vivenciam diariamente. A experiência buscou aproximar os participantes da rotina de uma pessoa com deficiência, além de sensibilizar quanto às dificuldades que enfrentam diariamente.
A pessoa com deficiência é a segunda maior população das minorias do mundo, segundo a ONU. No Brasil, a porcentagem chega a 15% da população, o que corresponde a quase 30 milhões de brasileiros. Apesar do número expressivo, o preconceito ainda é vivido diariamente. Para Ana Carolina Rocha, modelo, dançarina, servidora pública, cantora e criadora do perfil Ativismo EB, quando a deficiência é associada a uma doença rara, o desafio se torna ainda maior. Ela destaca que é preciso dar voz, já que na sociedade, os locais de fala são tomados das pessoas com deficiência, que assim não conseguem se expressar, ficando ainda mais marginalizado. “Nossa sociedade é muito visual e as pessoas ainda não estão acostumadas com corpos diversos. Precisamos avançar muito ainda para ter a verdadeira inclusão, em que todos os corpos são aceitos como são e as pessoas valorizadas não pela casca, mas pelas suas capacidades”, disse.
As dificuldades diárias também foram elencadas pela modelo, bailarina e servidora pública Elisângela Araújo, como ´pegar um ônibus ou até mesmo tirar carteira de habilitação. “Nada disso me faz menor que os outros, eu sou capaz. Às vezes as pessoas me olham se perguntando: ‘será que ela é capaz?’ O que me entristece, mas com muita força e garra eu continuo”, afirmou ao destacar que enxerga as possibilidades que o mundo dá e corre atrás dos seus objetivos.
A legislação vigente que garante os direitos de pessoas com deficiência foi abordada pela advogada Maria Eduarda Soares Mendonça. Ela destacou que as leis precisam ser cada vez mais usadas, ao lembrar a Constituição de 88 e a Constituição da Pessoa com Deficiência, que traz o conceito biopsicossocial e a deficiência com foco na sociedade e a inclusão, tirando a abordagem da deficiência como um impedimento. A ativista falou ainda sobre a punição a preconceitos. “Enxergo cada vez mais a necessidade de a pessoa com deficiência ter a sua cidadania ganha. A gente luta todo dia para que nossos direitos não estejam apenas em uma lei, mas que seja realidade. Quando temos nossos direitos respeitados, vivemos com ampla cidadania e dignidade e plenitude”, afirmou.
A servidora pública Miriam Grassi, também esteve presente na mesa de abertura do evento e falou sobre como o AVC isquêmico que teve há dois anos foi um divisor de águas na sua vida. Ela conta que decidiu abrir mão da aposentadoria do INSS e voltar a trabalhar, afirmando que só quer o direito de exercer os seus direitos. A modelo do projeto Fashion Inclusivo e dançarina, é também escritora de um livro que conta a sua história e busca inspirar pessoas e lembrar que todos conseguem alcançar seus sonhos.
Como forma de quebrar tabu, a especialista em Reabilitação Pélvica, Gênero e Sexualidade Fernanda Moraes, falou sobre a saúde sexual da pessoa com deficiência. “Temos dificuldades de falar sobre sexo, ainda é um assunto cercado de mitos e dúvidas que passam de geração em geração, mas é muito importante e influencia nossa saúde, precisamos quebrar essas barreiras e falar mais sobre o direito sobre a sexualidade e os próprios corpos, que faz parte do dia a dia e é a forma como nos expressamos.” A fisioterapeuta afirmou que as pessoas com deficiência enfrentam barreiras associadas à infantilização, falta de informação, exclusão em debates sobre educação sexual, falta de políticas públicas mais engajadas e de profissionais capacitados.
Para a diretora da Escola de Governo Fiocruz-Brasília, Luciana Sepúlveda, o evento se alinha à política de inclusão e acessibilidade da Fiocruz de buscar a convivência, escuta, troca e aprendizagem com as pessoas com deficiência que têm uma história, uma luta e ajudam a entender melhor e desenvolver a empatia. “Nos ajudam ainda a entender o quanto a sociedade ainda é despreparada para o entendimento da riqueza da diversidade e do respeito ao direito de todas as pessoas, de mobilidade urbana, trabalho, educação, cultura, lazer e cidadania plena. O capacitismo e o preconceito estão escondidos dentro da gente e muitas vezes não percebemos. Essa luta é de todos nós, para uma sociedade justa, democrática e inclusiva”, ressaltou.
O evento foi transmitido pelo canal da Fiocruz Brasília no Youtube e pode ser assistido aqui
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