Praia, rio, mangue e dunas fazem parte da beleza natural da região de Sabiaguaba, em Fortaleza (CE), mas desde a década de 1980, a comunidade litorânea tem sofrido impactos sociais e ambientais, como a ocupação irregular, especulação imobiliária e obras estatais. O professor de educação física das duas escolas de Sabiaguaba, Alan Raymison Tavares Rabelo, é nativo da região, mora na comunidade e compartilha com os vizinhos e lideranças comunitárias o sentimento de pertencimento e cuidado com o território. Ele viu no Mestrado Profissional em Políticas Públicas em Saúde uma possibilidade de estudar essa organização e participação dos moradores no cuidado com o que é deles. Rabelo coletou dados durante a pandemia de covid-19, por meio de entrevistas com cinco moradores e participantes de movimentos populares, associações e organizações não – governamentais atuantes na região e que já organizaram alguma atividade de proteção de direitos socioambientais. Segundo ele, a pesquisa revelou novos conflitos ambientais e ampliou a compreensão dos conflitos já existentes – e como eles afetam a saúde e a vida da população da Sabiaguaba.
Saiba mais nesta entrevista para o Fala aê, mestre!
Qual a relevância do seu estudo?
Alan Rabelo: O que achei mais pertinente foi o mapeamento dos conflitos e a sua relação com processo de saúde-doença. Muitas vezes as questões ambientais não aparecem de forma explícita quando analisamos a situação de saúde de um indivíduo ou comunidade, apesar de ela ser fundamental, em especial numa área como a Sabiaguaba, cercada de Áreas de Proteção Ambiental. Nós brasileiros devemos participar mais das ações de promoção à saúde e não somente deixar ao SUS essa tarefa. Nós somos o SUS e nossa participação é fundamental para que nosso sistema de saúde seja efetivo, de olho para a dinâmica micro dos nossos territórios.
Por que você coletou dados por meio da técnica de bola de neve, em que cada entrevistado indica outras pessoas com perfil para próximas entrevistas?
Alan Rabelo: Apesar de territorialmente grande, a Sabiaguaba é uma região no qual as lideranças têm contatos entre si, pela luta em defesa do território. Mesmo sendo do território, eu não conhecia todas as pessoas, logo o método foi bem efetivo, pois pude identificar outras lideranças comunitárias de regiões que não tinha contato.
Você utilizou questionários para entrevista semiestruturada. Já tinha familiaridade com este instrumento de coleta de dados? Por que decidiu trabalhar com ele?
Alan Rabelo: Já havia utilizado entrevista semiestruturada na graduação e em algumas pesquisas em que atuei como entrevistador. É o instrumento mais efetivo para entender a complexidade do processo saúde-doença nas ações de Vigilância Popular em Saúde, promoção da saúde em enfrentamento aos conflitos ambientais, pois essa quantidade de conteúdos necessita de um espaço de fala maior e intervenções precisas e pontuais do entrevistador.
Qual foi o resultado mais importante do seu estudo?
Alan Rabelo: Identificar como as ações de vigilância popular em saúde têm sido efetivas na defesa do território e do seu povo, mesmo enfrentando o estado e o capital através da especulação imobiliária. Descrevi como esse grupo de lideranças tem se articulado para garantir direitos sociais e produzir vida ao mesmo tempo que defende uma forma de vida vinculado à natureza e ao próprio território, e essa foi a maior riqueza do trabalho.
Qual foi o principal desafio para a execução do seu estudo em seu local de trabalho?
Alan Rabelo: Todo o período de mestrado foi difícil, mas construir a pesquisa em meio a pandemia, com encontros seguindo diversos protocolos de saúde foi muito complexo.
Por que você quis estudar na Fiocruz Brasília?
Alan Rabelo: Participar desta instituição enquanto mestrando foi uma realização pessoal e acadêmica. Me senti honrado pela importância da instituição no Brasil e no mundo. Quando soube da minha aprovação, foi uma grande felicidade tendo em vista que fui o primeiro mestre da minha família, honra que tive oportunidade de compartilhar com vários colegas de turma. Além disso, a Fiocruz Brasília tem sido uma grande parceira na articulação dos movimentos sociais e populares que lutam em torno da promoção e vigilância dos territórios.
Fazer o mestrado foi importante para a sua vida profissional? O que mudou depois deste estudo, para você?
Alan Rabelo: Continuo trabalhando na Sabiaguaba, local do meu estudo, então a pesquisa amplificou minha compreensão sobre os territórios e seus problemas de saúde, algo que me tornou mais eficiente na realização do meu trabalho, já que consigo enxergar a complexidade que é a dinâmica de saúde no local. Além disso, o trabalho me capacitou a articular diversos atores na defesa do território e nas ações de promoção à saúde.
Alan Raymison Tavares Rabelo é autor da dissertação “O território da Saiaguaba e a construção da vigilância popular em saúde e ambiente, aprovada em 23/03/2023, no Mestrado Profissional em Políticas Públicas em Saúde da Escola de Governo Fiocruz – Brasília, sob orientação da professora Juliana Wotzasek Rulli Villardi e coorientação do professor Fernando Ferreira Carneiro.
O Fala aê, mestre é parte da série de divulgação científica Fala aê, em que pesquisadores e estudantes que fazem ciência na Fiocruz Brasília são entrevistados e apresentam seu trabalho com respostas interessantes e em linguagem acessível ao público leigo. Para ler todas as entrevistas da série, clique neste link: FALA AÊ.