Moradores de comunidades do Piauí aprendem sobre manejo das águas em curso da Fiocruz

Nathállia Gameiro 5 de fevereiro de 2019


Nathállia Gameiro

Na última semana, a Fiocruz Brasília finalizou o curso de Vigilância Popular em Saúde e Manejo das Águas no município de Ipiranga do Piauí, localizado a cerca de 220 quilômetros de Teresina. A turma participou de atividades presenciais e de campo, e foi composta por agricultores familiares, técnicos do Fórum Piauiense de Convivência com o Semiárido, trabalhadores da saúde, estudantes, professores e técnicos de agropecuária das comunidades de Brejo da Fortaleza e Fornos. Os mais de 100 alunos realizaram durante o curso trabalhos que impactam diretamente os territórios, considerando a realidade de cada um.

 

A formação teve início em setembro do ano passado e levantou questões como água e soberania alimentar, agroecologia, saneamento rural, saúde e vigilância dos territórios saudáveis e sustentáveis no semiárido. Durante o curso, além de pesquisadores, alguns moradores das duas comunidades ministraram módulos, uma forma de valorizar os saberes e práticas e reconhecer experiências locais. “A comunidade foi protagonista do curso. Na verdade, aprendemos mais do que doamos”, afirmou Marciele Batista, palestrante de um dos módulos do curso e membro da Obra Kolping do Piauí, organização da sociedade civil.

 

A chefe do Serviço de Saúde Ambiental da Superintendência Estadual da Funasa no Piauí, Danda Oliveira, destacou que é preciso acreditar no potencial das comunidades, pois elas têm conhecimento, força, poder e sabem o que precisam para o território. A idade dos participantes foi diversificada, de 15 a 71 anos, assim como o perfil, mas todos tinham algo em comum: aprender a viver, cuidar e valorizar o semiárido, além de mudar a realidade da população.

 

O aluno Francisco Janielson, da comunidade de Fornos, afirma que a formação teve um impacto significativo na região. Ele contou que aprendeu a forma correta de manejar e reutilizar a água, além de ver tecnologias sociais e as formas de utilizá-las no território. Francisco lembrou que o volume de chuva no Nordeste, especialmente no semiárido, vem diminuindo e por isso, a população precisa ter o cuidado de armazenar a água da chuva e reutilizar água cinza para evitar a escassez. “A água na região é utilizada para produzir cada vez mais e melhor e assim, garantir a soberania alimentar e, consequentemente, a nossa sobrevivência no nosso semiárido, que cada vez mais vem sendo castigado pelas secas, que ano a ano vêm se perpetuando no nosso território”, completou.  

 

 

Durante a formação, os estudantes destacaram as necessidades de cada comunidade, como a má distribuição da água e conscientização da população sobre o desperdício, além da definição de prioridades. Ao final, foram desenvolvidas tecnologias sociais para o reuso de águas, reaproveitamento de resíduos sólidos, compostagem, criação de banco de sementes, produção de viveiros e mudas medicinais, eliminação de vazamento de água de cisternas e implantação de hortas com micro irrigação. As tecnologias foram inseridas em algumas casas e na Escola Liberato Vieira, um dos locais onde as aulas foram ministradas. O grupo realizou também, junto às comunidades, o Mapa das Águas, com a utilização de georeferenciamento,  desenho das estruturas das casas e a localização de águas de qualidade e contaminadas.

 

O prefeito do município de Ipiranga do Piauí, José Santos Rêgo, ou Zé Maria, como é conhecido na região, foi uma das autoridades que compareceu à cerimônia de encerramento do curso. Ele afirmou que, com a escassez da chuva, os moradores da região precisam aprender a conviver com a pouca quantidade de  água disponível, pois no local já está sendo utilizada reserva, vinda da perfuração de poços. Para ele, o curso mostrou alternativas para se viver no semiárido e diminuir a quantidade de pessoas que se mudam para outras cidades do país fugindo da falta d’água. “Só precisamos aproveitar nossas potencialidades. As pessoas aqui aprenderam a gastar menos água, conservá-la e a criar um sistema de reaproveitamento e agora vamos usar esse conhecimento no dia a dia, com alternativas para viver melhor aqui mesmo. Vamos poder colocar em prática ideias novas e transformadoras que esses trabalhos e o curso trouxeram e que queremos levar para mais famílias, e assim ajudar na transformação da nossa região”, afirmou.

 

O curso, coordenado pelos pesquisadores Jorge Machado e Alexandre Pessoa, da Fiocruz Brasília e da Escola Politécnica em Saúde Joaquim Venâncio (EPSJV/Fiocruz), respectivamente, é uma ação do Programa Território Saudável e Sustentável no Semiárido, uma cooperação entre Fiocruz e Funasa. Tem como objetivo a implementação de ações de saneamento ambiental, por meio da aplicação do conceito de Territórios Saudáveis e Sustentáveis e da Convivência com o Semiárido. O programa conta com o apoio da Federação dos Trabalhadores Rurais Agricultores e Agricultoras Familiares do Estado do Piauí; do Centro de Referência em Saúde do Trabalhador (CEREST) da Secretaria de Saúde do Estado do Piauí; do Projeto Viva Semiárido; da Obra Kolping, e do Fórum Piauiense de Convivência com o Semiárido (FPCSA), que articula organizações da sociedade civil.

 

Além dos parceiros e da Fiocruz Brasília, integram a equipe do projeto pesquisadores da Fiocruz Bahia e Fiocruz Piauí. Eles participaram de uma agenda intensa de reuniões durante toda a semana, com autoridades como a vice-governadora do Piauí, Regina Sousa, com as Secretarias de Meio Ambiente e Recursos Hídricos, de Desenvolvimento Rural, de Educação, de Saúde, do Planejamento, Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), Fundação Nacional de Saúde (Funasa), instituições de ensino e pesquisa, prefeitura de Picos e Ipiranga e organizações da sociedade civil. O objetivo dessas agendas políticas foi buscar continuidade das ações do projeto e possibilitar que sejam ofertadas outras formações neste território para a melhoria da qualidade de vida da população, além de criar a agenda de trabalho até 2020 com a Funasa.

 

Um dos resultados imediatos foi a criação do Comitê Estadual para a solução das necessidades levantadas pelos alunos durante o curso, e a aproximação com a prefeitura local para ampliação do projeto para outros municípios do Piauí.

Confira a matéria produzida pela Secretaria de Comunicação do Governo do Estado do Piauí sobre a reunião com a vice-governadora, Regina Sousa:
Regina Sousa e representantes da Fiocruz debatem criação de comitê com políticas para convivência com o semiárido