Claudia Bittencourt – Ascom SE/UNA-SUS
A luta de Lívia Viegas contra o câncer começou em 2013, quando aos 39 anos, foi diagnosticada com câncer de mama bilateral. Por meio do autoexame e da observação do próprio corpo, a trabalhadora do setor de suporte da UNA-SUS percebeu que havia algo errado, apesar de ter realizado uma mamografia quatro meses antes, que não acusou nenhuma anomalia. Porém, o câncer era de um tipo raro, de desenvolvimento rápido e já estava no terceiro grau, o segundo mais grave.
Após a realização das cirurgias para retirada do tumor, reconstrução das mamas e do tratamento com quimio e radioterapia, o câncer teve recidiva três anos depois nos linfonodos. Foi então que uma segunda batalha começou. “Não é um tratamento fácil, mas é um tratamento totalmente possível. Além da informação, precisamos ter conscientização: não somente fazer o preventivo, mas se perceber todos os dias, saber o momento do seu corpo, que foi o que me fez perceber a recidiva”, contou.
Lívia também falou sobre o impacto emocional que a doença traz e destacou a importância do acolhimento das pessoas próximas como familiares, amigos, profissionais de saúde e colegas de trabalho. “O tratamento machuca o corpo e a alma, não é só físico, é sentimental. A acolhida é fundamental. Também é preciso acreditar que vai dar certo. Eu não gosto de chamar o câncer de doença, prefiro chamar de vivência”, disse. Os relacionamentos foram fundamentais. Apesar da dor de ver sua mãe sofrer durante o tratamento, a família foi a rocha de Lívia. Especialmente seu marido, Marcelo, que sempre esteve ao seu lado.
A experiência de Lívia foi compartilhada nesta quinta-feira, 31/10, quando os trabalhadores da Fiocruz Brasília e da Universidade Aberta do SUS (UNA-SUS) participaram de uma Roda de Conversa sobre a saúde da mulher e do homem, em alusão às campanhas Outubro Rosa e Novembro Azul. O encontro contou com palestras sobre a prevenção do câncer de mama, do colo do útero e da saúde do homem.
Saúde da Mulher
Prevenção do câncer de mama – Para abordar a prevenção do câncer de mama e de colo do útero, a roda contou com a palestra da nutricionista Aline Leal Gonçalves, pesquisadora da Saúde da Mulher pelo projeto Marco da Fiocruz Brasília.
A pesquisadora falou sobre a Política Nacional de Prevenção e Controle do Câncer no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS), que preconiza reduzir a mortalidade, reduzir incidência de alguns cânceres e contribuir com a qualidade de vida do paciente. “A prevenção se baseia no controle dos fatores de risco modificáveis e na promoção de fatores de proteção”, afirmou. Nesse sentido, a pesquisadora abordou a importância da detecção precoce, por meio do autoexame, além das ações de prevenção, como a prática de atividades físicas, a alimentação saudável e o aleitamento materno.
Além dos exames preventivos, Aline ressaltou a importância de se procurar o sistema de saúde logo nos primeiros sintomas que, no caso do câncer de mama, podem incluir alterações no mamilo: pequenos nódulos, líquido ou pele avermelhada e retraída.
De acordo com o Instituto Nacional do Câncer (INCA), o câncer de mama é o mais incidente no mundo. Entre as causas associadas, estão as questões endócrinas, comportamentais e ambientais, como sedentarismo, tabagismo e consumo de bebida alcóolica. A pesquisadora destacou que não há estudos que apontem os níveis seguros para o consumo de álcool.
Os fatores genéticos e hereditários também são importantes de serem observados, e geralmente estão relacionados à presença de mutações em determinados genes transmitidos na família, especialmente BRCA1 e BRCA2. “Mulheres com histórico de casos de câncer de mama em familiares consanguíneos, sobretudo em idade jovem, de câncer de ovário ou de câncer de mama em homem, podem ter predisposição genética e risco elevado para a doença”, ressaltou Aline.
Para detectar os fatores hereditários, diversos estados brasileiros contam com exames genéticos de detecção do câncer de mama pelo SUS, incluindo o Distrito Federal.
Câncer de colo de útero – O Brasil segue as orientações das Diretrizes Brasileiras para o rastreamento do câncer de colo do útero. A publicação integra o conjunto de materiais técnicos baseados na Política Nacional de Prevenção e Controle do Câncer e apresenta orientações para a detecção precoce do câncer do colo do útero, com as respectivas recomendações e diretrizes clínicas.
Com relação a essa enfermidade, Aline explicou que a principal causa é a infecção pelo vírus HPV, e destacou a importância da realização os exames preventivos e da iniciação do tratamento das lesões pré-cancerígenas, assim que forem detectadas.
A vacinação do HPV também é uma importante estratégia de prevenção de meninas e meninos, homens e mulheres, já que o HPV não traz riscos somente às mulheres. “Homens podem ter outros tipos de câncer associados ao vírus como boca e faringe. É tão importante vacinar os meninos quanto as meninas, a vacina do HPV é a única disponível contra câncer”, abordou a pesquisadora.
Saúde do Homem
De acordo com o Ministério da Saúde, o Brasil é o único país da América Latina com uma política de saúde específica para a população masculina: a Política Nacional de Atenção Integral à Saúde do Homem (PNAISH). Os objetivos da PNAISH são promover a melhoria das condições de saúde da população masculina brasileira, contribuir para a redução da morbidade e da mortalidade dessa população e abordar os fatores de risco e vulnerabilidades associados.
Para tratar do tema, a roda de conversas contou com a palestra sobre saúde do homem, ministrada pelo sanitarista Fernando Pessoa Albuquerque, que atua na Coordenação de Saúde do Homem (COSAH) do Departamento de Ciclos de Vida (DECIV) e da Secretaria de Atenção Primária à Saúde (SAPS) do Ministério da Saúde. Autor do livro Homens, masculinidades e saúde mental, Fernando abordou como a perspectiva de gênero na sociedade afeta os cuidados na saúde – tanto dos homens quanto das mulheres.
O sanitarista mostrou alguns dados sobre saúde dos homens. A cada cinco atendimentos da Atenção Primária, apenas um é masculino. Os homens cometem suicídio quatro vezes a mais que as mulheres. Homens têm 1,4 vezes mais chances de morrer por problemas cardíacos, 50% de chance a mais de morrer por doenças respiratórias crônicas – relacionadas ao uso de cigarros e à demora do tratamento, 10% a mais por diabetes e 30% a mais por neoplasias.
“Essa construção social afeta nos cuidados dos homens, que desde muito pequenos, aprendem que devem se mostrar fortes, que aguentam e não demonstram vulnerabilidade. Por isso, os homens demoram mais para chegar nos serviços de saúde”, afirmou. “Esse é um desafio e a política promove essa reflexão. Dependemos de uma transformação sociocultural”, pontuou.
Fernando apontou também que nas famílias brasileiras, quem geralmente leva os homens ao médico são as mulheres, o que as sobrecarrega no cuidado.
De acordo com o palestrante, a forma com que os homens aprendem a ver a si mesmos e a projetar sua imagem, muitas vezes é um componente inseparável das causas que explicam a morte prematura: atribuível ao estresse e aos hábitos pouco saudáveis como direção imprudente, consumo de álcool, abuso de drogas, comportamento sexual de risco, esportes e atividades recreativas de alto risco. “É um desafio construir uma educação emocional entre os homens, para que possamos nos entender e se livrar do padrão ‘já que eu não posso sentir a dor, eu provoco a dor, descarrego as emoções’”, explicou.
Por fim, segundo a secretária executiva da UNA-SUS e diretora da Fiocruz Brasília, Fabiana Damásio, “a roda foi construída coletivamente pelos trabalhadores. Cada vez mais precisamos abrir esses espaços, é muito importante compartilhar novas histórias e vivências, pois é a partir delas que aprendemos a promover o cuidado”, destacou.
A UNA-SUS possui diversos cursos voltados ao cuidado da saúde da mulher e do homem. Para conhecer, acesse aqui.
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