Nathállia Gameiro
Trabalhadores do Sistema Único de Assistência Social (SUAS) de diversos municípios do Brasil participaram na última sexta-feira, 21 de agosto, do webinário “Trabalho Social com Famílias: olhares, reflexões e construções colaborativas”. O evento foi organizado pelo PesquisAr SUAS, grupo de pesquisa fruto de parceria entre a Fiocruz Brasília e trabalhadores da Secretaria de Desenvolvimento Social do DF, cujo objetivo é melhorar o cotidiano de trabalho da Assistência Social, por meio de pesquisas e estudos.
A importância da educação permanente foi lembrada pela coordenadora da pesquisa e colaboradora da Fiocruz Brasília, Anna Pontes. “É pela educação permanente que desenvolvemos nosso trabalho, e a Escola de Governo Fiocruz – Brasília tem essa preocupação na capacitação dos profissionais para o SUS e para o SUAS”, afirmou.
O grupo foi criado em 2018 e, desde então, estuda temáticas ligadas à Assistência Social, buscando criar ferramentas metodológicas e de reflexão para melhorar a atuação desses profissionais. A pesquisa envolve várias fases e busca a contribuição de trabalhadores da assistência social de todo o Brasil, a partir de suas experiências. O projeto é financiado pela Fundação de Apoio à Pesquisa do Distrito Federal (FAP-DF).
A assistente social Daiana Brito se apresentou lembrando o local onde nasceu e foi criada: Ceilândia, região administrativa do DF. “O meu território de vivência é também o território de vivência das famílias que atendo”, afirmou, destacando que o trabalho social com as famílias não é neutro e que é essencial não as estigmatizar no cuidado. “As experiências dos trabalhadores se relacionam com a forma como traduzem as teorias que vão estudando, não existe neutralidade nessa atuação”, completou.
Durante evento, foram debatidas situações de risco e vulnerabilidades que as famílias atendidas enfrentam, e a necessidade de o profissional conhecer as especificidades e os serviços presentes no território. “Um olhar simples no território, mas com cuidado e acolhimento, muda a forma como vamos atuar, a partir do que ele vive e das relações que essas pessoas têm”, disse Daiana.
Para ela, as desigualdades sociais, escancaradas ainda mais na pandemia, agravando a vulnerabilidade social e trazendo novas famílias para o risco social, fizeram valer a necessidade de continuar a pesquisa. Entre as desigualdades, destaca-se a de conexão à internet, que dificulta o acesso à previdência social, por exemplo, já que o sistema é todo informatizado.
A assistente social Regina Célia Mioto, professora e integrante do Núcleo de Pesquisa Interdisciplinar Sociedade, Família e Políticas Sociais da Universidade Federal de Santa Catarina (NISFAPS/UFSC), acrescentou que a pandemia revela as desigualdades regionais, de classe, raça e gênero, e mostra os problemas relativos à difícil convivência familiar decorrente dos costumes e tradições. Para ela, a família se apresenta como central no amortecimento dos impactos da pandemia.
A pesquisadora apresentou ainda aspectos históricos que inseriram o trabalho social com famílias no Brasil, a partir da estruturação do SUAS e da Política Nacional de Assistência Social. De acordo com Regina, essas mudanças trazem o lugar da família na proteção social e quanto cabe a ela a provisão social. Ela afirmou que, neste momento, em que os profissionais de todas as áreas estão expostos a diversos desafios, os trabalhadores do SUAS têm convivido com o desmonte da Política Nacional de Assistência Social e com a premência de cada dia mais operar com menos recursos. “Antes nunca problematizado, o campo da política social brasileira traz também a relação entre Estado e família, considerando que a política social é um dos canais privilegiados de intervenção nas famílias e nos atenta ao controle social”, explicou.
Regina acredita que essa grande crise pode gerar um momento muito importante para uma nova forma de escuta e abordagem especializada, além da provocação e diálogo sobre antigos e novos desafios. Para a professora, a qualidade do serviço depende da relação entre o profissional e o usuário; por isso, destaca que é preciso pensar em alternativas com os recursos disponíveis no momento e incorporar demandas identificadas nas famílias atendidas. Segundo Regina, entra em questão o conhecimento do território e das famílias que nele vivem, independentemente de estarem vinculadas ou não aos atendimentos. Assim, é possível levantar indicadores como acesso à água e quantidade de idosos moradores do local, por exemplo, o que ajudaria a pensar em novas ações, chegar a essas pessoas e, ainda, interferir em outros espaços. “Temos que ser os grandes porta-vozes dessa população no plano da esfera pública. Não importa a situação ou a família, mas costurar uma série de questões que devem fazer parte da agenda pública”, disse.
A assistente social destacou a relevância do PesquisAR SUAS, que, de acordo com ela, nasce do encontro de profissionais comprometidos com a busca de respostas, a qualidade dos serviços e a sustentação do SUAS. “O grupo busca romper com a dicotomia entre teoria e prática, academia e trabalho. Ele transforma a prática do trabalho no dia a dia em desafios intelectuais e, vinculado à educação permanente, faz com que se revele a inovação da pesquisa”, definiu.
A live completa pode ser assistida aqui.