A Política de Monitoramento e Avaliação do Sistema Único de Saúde é importante e transversal a todas as áreas técnicas do Ministério da Saúde. Para construí-la, o Ministério contará com a contribuição de pesquisadores da Fiocruz Brasília que tiveram um projeto selecionado na Chamada nº 22/2023 do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), destinada a pesquisas que apoiem os gestores da Saúde na tomada de decisão em políticas públicas. De acordo com a coordenadora da proposta, Katia Zeredo, à frente do Serviço de Gestão do Trabalho (Segest) da Fiocruz Brasília, um dos méritos do projeto é reunir as experiências de diferentes profissionais da instituição. “Vimos uma oportunidade de unir nossos esforços para produzir e sistematizar um conhecimento que pode ser aplicado em todas as políticas, pois o monitoramento e a avaliação são aspectos que devem estar presentes em todas elas”, afirma Katia.
A metodologia que será utilizada no projeto foi desenvolvida pelo pesquisador Rafael Schleicher, da Fiocruz Brasília, durante o período em que ele atuou na Escola Nacional de Administração Pública (Enap), e já foi aplicada com sucesso em outras oportunidades, como, por exemplo, para atender a uma demanda do Ministério da Educação (na análise da Política Nacional de Proteção ao Ambiente Escolar) e em um projeto sobre tuberculose em São Tomé e Príncipe. “Onde houver um problema para ser resolvido, sobre qualquer tema, essa metodologia pode ser usada”, adianta Rafael. O que o grupo da Fiocruz Brasília vai fazer é uma análise ex-ante, que, apesar do nome diferente, nada mais é do que o desenho e o teste de uma política antes que ela seja publicada. O governo federal tem um guia de análise ex-ante, no qual Rafael se baseou para criar um processo mais dinâmico e participativo.
“O ano era 2020, em meio à pandemia, e precisávamos transformar práticas presenciais em remotas. Era difícil manter as pessoas engajadas em reuniões semanais de duas a três horas, até mesmo por causa das questões de saúde mental provocadas pelo isolamento”, lembra o pesquisador. Foi nesse contexto que surgiu a ideia de criar um espaço virtual com um design gráfico que atraísse a atenção, incluindo quadros colaborativos e um tabuleiro de jogo. Essa gamificação foi inspirada no RPG (Role Playing Game ou jogo de interpretação de papéis, em tradução livre), em sua modalidade colaborativa. “O RPG é como um romance de narrativa aberta: os jogadores interpretam personagens que interagem entre si e tomam decisões para alcançar objetivos”, explica Rafael, que conseguiu combinar suas experiências como pesquisador e jogador. “Embora ainda persista um preconceito, esse universo do RPG pode ser muito útil na avaliação de políticas”, assegura.
No RPG aplicado à avaliação de políticas, não há personagens e cenários fictícios, dados ou sorte, mas evidências científicas e pessoas com diferentes perfis e opiniões discutindo e colaborando entre si para construir uma política consistente. Só que, assim como nos jogos, os participantes também recebem ‘recompensas’ – como no Super Mario Bros, moedas e troféus simbólicos são entregues para os grupos quando cumprem as tarefas e fazem as entregas propostas. “Já existe um roteiro do que é preciso fazer na avaliação de uma política, o aspecto inovador desse modelo está no como fazer. É um modelo que dá retorno rápido”, destaca Rafael.
No projeto da Fiocruz Brasília, o ‘jogo’ da análise ex-ante da Política de Monitoramento e Avaliação do Sistema Único de Saúde contará com até 20 pessoas indicadas pelo Ministério da Saúde – a diversidade do grupo é fundamental para o sucesso da iniciativa. Após entrevistas com os participantes, são realizadas 13 oficinas online (ou ‘partidas’) nas quais eles definem o problema central a ser enfrentado pela Política, os principais afetados por esse problema, suas consequências e causas, os objetivos que se espera alcançar, as ações necessárias para tal, os resultados esperados, a governança, a implementação, o orçamento e os indicadores. No início de cada oficina, é feita uma breve exposição sobre as principais evidências científicas disponíveis sobre o assunto que será tratado naquele encontro, de modo a ‘harmonizar’ o conhecimento dos diferentes participantes sobre aquela temática. Para tanto, os pesquisadores da Fiocruz Brasília farão uma análise documental e uma revisão sistemática da literatura sobre monitoramento e avaliação do SUS.
A entrega final do projeto será um relatório detalhado com o conhecimento produzido durante o percurso das oficinas. “Nesse modelo, quem conduz o processo apresenta as evidências disponíveis, mas não define nada. Tudo é decidido pelos participantes em discussões em grupo. Se houver contradições entre essas decisões e as evidências, isso fica registrado no relatório para subsidiar o Ministério da Saúde, até porque uma política não é feita só de técnica”, afirma Rafael. Esta é a sexta vez que ele vai aplicar a metodologia, e a primeira pela Fiocruz Brasília. Além de Rafael e Katia, participam do projeto Érica Tatiane da Silva, do Programa de Evidências para Políticas e Tecnologias de Saúde (Pepts), e Luiz Jupiter, do Serviço de Tecnologia da Informação (STI). Como parte das atividades, está previsto para maio próximo um evento sobre avaliação de políticas públicas de saúde.