Servidora da Fiocruz Brasília lança livro infantil a partir da sua vivência com o câncer de mama

Nathállia Gameiro 23 de outubro de 2019


 

Como parte das comemorações dos 43 anos da unidade e das ações do Outubro Rosa, gestoras, pesquisadoras, usuárias, ativistas e colaboradores da instituição participaram de roda de conversa sobre o tema

 

Nayane Taniguchi

 

Como será ter seis anos e ​de repente a mamãe ficar doente? Com a proposta de abordar o tratamento contra o câncer a partir do olhar de sua filha de seis anos, a servidora da Fiocruz Brasília, Dulce Ferraz  transformou sua história pessoal no livro “Mamãe, quando você vai sarar”. A partir da troca de vivências, relatos e abraços em uma roda de conversa emocionante, a publicação foi lançada na Fiocruz Brasília, na última terça-feira (22/10), como parte da programação dos 43 anos da Fiocruz Brasília, a ser celebrado no dia 25 deste mês, e das ações em alusão ao Outubro Rosa.

 

 A publicação convida para um mergulho no universo de Nina, uma menina muito observadora. Sua mãe, que nunca ia ao médico e nem parecia estar doente, de repente começa a ir quase todas as semanas ao hospital. Os exames, consultas, terapias e mais um monte de palavras novas invadem os dias e a rotina da família. “Mamãe vai ter que ficar muitos dias no hospital?” “É verdade que os cabelos dela vão cair?” “Afinal de contas, quando a mamãe vai sarar?”, são apenas algumas das questões vividas pela pequena Nina.

 

“Sabemos que a nossa história é também a história de muitas famílias. Só no Brasil, quase 600 mil pessoas são diagnosticadas com algum tipo de câncer todos os anos e 60 mil delas são mulheres com câncer de mama. A ideia deste livro é dialogar com as crianças sobre esta experiência surpreendente, que desperta muitas dúvidas e sentimentos – até mesmo nos adultos! O convite, então, é para que atravessemos a experiência juntos, olhando-a através dos olhos da Nina”, afirma a autora.

 

Roda de conversa

Representantes da Organização Não-Governamental (ONG) Vencedoras Unidas também participaram da atividade, que proporcionou o encontro de vários segmentos da saúde – gestoras, pesquisadoras, usuárias, técnicas, entre outros, além dos colaboradores da instituição.

 

Partindo da experiência pessoal da autora, mãe de duas meninas, que enfrentou o câncer de mama, o livro dialoga com as crianças sobre a experiência de ter uma pessoa muito próxima passando por um longo tratamento de saúde. “Esta experiência desperta muitas dúvidas e sentimentos não só nas crianças, mas também nos adultos”, afirma Dulce.

 

“Esta atividade reforça a importância de se discutir temas da agenda da saúde e que demandam atenção maior de todos nós. A partir deste livro, temos uma demonstração de como a ciência e as políticas públicas podem se relacionar com a arte”, destacou a diretora da Fiocruz Brasília, Fabiana Damásio. Por meio da publicação, Dulce ressignificou o câncer, o que reforça a importância dos cuidados com a saúde e com o corpo, pensando ainda esse cuidado como estratégia coletiva, ao longo de todo o ano. “Dulce foi brilhante ao ressignificar a doença e materializar sua história, de dor, mas que pode ser contata de tantas formas, e que foi transformada em uma história para ser compartilhada com outras mulheres”.

 

Dulce abordou a importância de se falar sobre o câncer, por ser uma doença presente na vida de muitas pessoas, pela sua incidência e sempre ter alguém próximo – amigo, conhecido ou parente – que já foi diagnosticado com câncer. “A informação empodera o paciente”, ressaltou.

 

O livro surgiu a partir de sugestões de amigos para que a autora fizesse um registro de sua experiência. Por ser da área da saúde, Dulce decidiu fazer relatos sobre o tratamento, que envolvia radioterapia, dialogando com o que estudava à época. “Mas a relação com as crianças não cabia em um texto acadêmico, então decidi elaborar um texto que pudesse ser lido com as crianças, por vivermos muitos questionamentos nesse período. É importante que elas saibam o que está acontecendo”, disse.

 

Atualmente, a ONG Vencedoras Unidas tem 400 integrantes, todas mulheres que já tiveram ou têm câncer, e que apoiam outras pacientes em tratamento, tanto assistidas pelo Sistema Único de Saúde (SUS) quanto na rede particular. O grupo foi criado com o objetivo de acolher e apoiar pacientes oncológicas. Mulheres, mães, jovens. Das quatro mulheres representantes da ONG que participaram da roda de conversa, três têm menos de 40 anos. “É preciso mostrar o quanto o autocuidado é importante. O nosso Outubro Rosa é o ano inteiro”, ressalta a professora Lilian Kelly de Oliveira, uma das integrantes da ONG. Maria Aparecida Luchetti, 51 anos, afirma que o trabalho desenvolvido pelo grupo é gratificante, mas também a deixa mais triste. “Cerca de 75% das mulheres são abandonadas pelos seus companheiros. Mas o câncer foi uma escola para mim, um aprendizado muito grande. Fiz uma reviravolta na minha vida e uma delas é o meu envolvimento com o trabalho voluntário”, acrescentou.

 

Aos 29 anos, Raquel Carvalho foi surpreendida, 29 dias após o nascimento da sua filha, com a notícia de que estava com um tumor de nove centímetros. “Não escolhi passar por isso, mas como eu passei por tudo isso foi uma escolha minha”, ressaltou. Entre suas escolhas, está a criação do grupo que originou a ONG. “Diferente de algumas pessoas, não consigo enterrar o câncer. Ele reorganizou a minha vida e me fez enxergar que não tenho o controle da minha vida. O câncer mudou o que sou”, complementou. A cada novo exame para certificar que não há um novo tumor, ela afirma ser sempre lembrada de que não tem controle da própria vida, “então vamos viver o hoje”, afirmou.

 

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