Fernanda Severo (Nusmad/Fiocruz Brasília)

Memória e história da saúde mental brasileira em vidas pulsantes

A Instalação Virtual Morar em Liberdade – Retratos da Reforma Psiquiátrica Brasileira, recém-lançada, é uma plataforma interativa que reúne histórias, imagens e sons que narram vidas atravessadas pelo período de privação de liberdade, pela luta e potência criativa de existir de formas diversas, exercendo direitos de cidadania.  A Instalação apresenta um acervo de vídeos, fotografias, colagens e bordados, acompanhados de textos que destacam cenas das histórias e dos testemunhos das pessoas que vivenciaram o sistema manicomial e reconstruíram suas vidas em liberdade.

Morar em Liberdade é um projeto de memória, história e salvaguarda desenvolvido pela Fiocruz Brasília, por meio do Núcleo de Saúde Mental, Álcool e Outras Drogas (Nusmad), e a TV Pinel. E, desde 2024, em parceria com o Departamento de Saúde Mental, Álcool e Outras Drogas (Desmad), que integra a Secretaria de Atenção Especializada do Ministério da Saúde.

A concepção e curadoria dessa ação comunicacional foi iniciada em 2018, nas edições físicas da Instalação de fotografias e vídeos. Ao todo, foram 13 montagens originais apresentadas entre Rio de Janeiro, Minas Gerais e Brasília, inspiradas nas mostras do Museu da Imagem do Inconsciente e no Centro Cultural do Ministério da Saúde (CCMS). Os conteúdos qualitativos da pesquisa “Memórias da Saúde Mental: Cultura, Comunicação e Direitos Humanos/Morar em Liberdade” (2017-2025) e “Avaliação do Programa de Volta para Casa” (2017-2021) foram os pontos de partida do acervo de história, ciência e arte da memória coletiva da desinstitucionalização.

A experiência virtual propõe uma reflexão sobre a trajetória da Reforma Psiquiátrica no Brasil, destacando os avanços do Sistema Único de Saúde (SUS) na ampliação da garantia de direitos e na promoção de cuidados em liberdade que interpelam o direito à cidade, à moradia e à comunicação das pessoas que vivem com sofrimentos mentais. Por meio de registros audiovisuais e sonoros, a Instalação apresenta as expressões dos usuários da saúde mental, na sua maioria egressos de longas internações psiquiátricas. Assim, o visitante é convidado a conhecer de perto narrativas que rompem o silêncio, desafiam o olhar e convocam a revisar os conceitos de loucura. 

Da costura da arte, ciência e história resultaram os registros diferenciados dos cotidianos regionais da Reforma Psiquiátrica Brasileira e seu impacto na vida de tantas pessoas. Paralelamente, é possível explorar uma linha do tempo, que permite navegar entre a micro e macro história da Reforma e das políticas públicas da saúde mental. A mostra aborda, ainda, o fundo documental Cadernos da Reforma, em homenagem a Domingos Sávio, que conta com testemunhos de gestores que remontam cenas contemporâneas da consolidação dessas políticas públicas locais e nacionais (disponibilizado parcialmente em Ciência Aberta e publicações – Cadernos da Reforma). Também está disponível o catálogo do Cine Intervalo com, aproximadamente, 100 referências audiovisuais, entre curtas e média-metragens, documentários e produção de usuários. Os materiais complementares para aprofundar a experiência de conhecimento em multilinguagem estão acessíveis ao espectador para download.

A Instalação Virtual Morar em Liberdade é um convite para navegar por salas temáticas que narram um pouco da história da pesquisa, da concepção estética e ambiências artísticas, explorar memórias e ver vidas pulsantes que conquistam expressões próprias e convidam a repensar o que é a loucura e o que o cuidado em liberdade, promovido pelos avanços das políticas públicas, ainda é capaz de realizar para garantir a plena cidadania e os direitos humanos.

A Instalação Virtual Morar em Liberdade pode ser visitada aqui.

Histórico da pesquisa

Pesquisa de vertente sócio-histórica longitudinal, iniciada em 2017, que prioriza os dispositivos das políticas públicas contemporâneas de Saúde Mental em suas múltiplas interfaces com a garantia de direitos humanos. Configura-se como um projeto interdisciplinar de resgate, guarda e difusão de histórias de vida da Reforma Psiquiátrica Brasileira, que inclui histórias de si e narrativas dos formuladores e gestores de políticas públicas, trabalhadores da atenção psicossocial, representantes do legislativo, executivo federal, dos movimentos sociais e usuários da Saúde Mental.

Como experiência comunicacional da ciência, consolida um acervo de pesquisa qualitativa sobre políticas de Saúde Mental, especificamente os desdobramentos históricos da Reforma Psiquiátrica Brasileira (1991-2024). Atualmente, tem acervo de cerca de 40 horas de documentação audiovisual, com entrevistas realizadas entre 2017 e 2019 com egressos de longas internações e trabalhadores da Atenção Psicossocial de Juiz de Fora (MG), Barbacena (MG) e Paracambi (RJ) e com gestores, formuladores e trabalhadores das políticas públicas de Saúde Mental.

O banco de dados multimídia é depositado em repositório institucional (Ciência Aberta) no Arca Dados da Fiocruz, desde 2020-2022, sendo a primeira pesquisa qualitativa da área inserida em repositório de Ciência Aberta. Esta ação fomenta diálogos em comunidades técnico-científicas e em disciplinas do Mestrado em Políticas Públicas em Saúde da Escola de Governo Fiocruz-Brasília.